Muita gente anda dizendo por aí que foi pega de “surpresa” pelo rebaixamento do Brasil. Das três, uma: ou é uma gente muito ingênua; ou está mentindo; ou então não lê este modesto Blog na Internet.
A escolha dentre as três? Deixo ao vosso critério.
O rebaixamento do Brasil e as perspectivas econômicas para 2015
Publicado originalmente em 25.3.14
Ontem, a agência de risco americana Standard & Poors “rebaixou” a nota no Brasil em seu ranking de classificação de países. Até aí, nada de novo. A notícia era tão esperada que, hoje, o dólar caiu e a bolsa subiu pelo sétimo dia consecutivo, numa prova de que o rebaixamento do país já estava “precificado” pelo mercado.
Não me interessa, aqui, falar dos problemas dessas classificações efetuadas pelas agências americanas. Isso já foi objeto em outra oportunidade (aqui). Tampouco me interessa analisar a fundo a credibilidade da S&P, que está sendo, com razão, processada pelo governo americano pela pantomima que ela e suas colegas Fitch e Moddy’s aprontaram em 2008 (aqui). Interessa-me, na verdade, projetar o que devemos esperar para o ano que vem.
“Não será um pouco cedo para discutir 2015?”, deve estar você se perguntando.
Ao que eu respondo “não”.
Do ponto de vista macroeconômico, as condições de 2014 já estão dadas. Teremos mais um ano de crescimento baixo e inflação elevada. Salvo um ou outro sobressalto decorrente do período eleitoral, não teremos um estresse continuado no mercado acionário, nem veremos o Brasil passar por uma crise semelhante às que o acometeram em 1995, 1997, 1999 e 2002. É dizer: teremos mais um ano perdido, mas o mundo não vai se acabar por causa disso.
Para 2015, no entanto, as perspectivas são um pouco mais pesadas. Muitos dos nossos problemas estão sendo jogados para debaixo do tapete por conta das eleições de outubro. Como tratá-los significa, na maior parte dos casos, tomar medidas impopulares, ninguém quer arcar com o custo eleitoral de adotá-las. Por isso mesmo, eles vão sendo empurrados com a barriga. Só que a barriga brasileira, como sabemos, não é suficientemente sarada para levar tanta carga por tanto tempo.
Independentemente de quem venha a ganhar a eleição, há vários nós econômicos para desatar que, mais hora, menos hora, terão de ser enfrentados pelo inquilino do Palácio do Planalto. Pela ordem de gravidade, os principais problemas macroeconômicos brasileiros são os seguintes:
1 – Déficit nas transações correntes: Só no mês passado, US$ 7 bilhões foram embora do país. O déficit projetado para 2014 já chega aos US$ 80 bilhões. É um patamar claramente insustentável, ainda mais quando o Brasil experimenta baixo crescimento – o que tende a diminuir os dólares que vêm para investimentos no país – e as exportações estão em queda – que poderiam sustentar o déficit com o excedente comercial.
2 – Congelamento dos preços administrados: Já vamos para o segundo ano em que os preços administrados encontram-se virtualmente congelados, eletricidade e combustíveis à frente. É uma política suicida porque não há como arcar com o custo inflacionário por tempo indefinido. O congelamento das tarifas de energia já custou ao Tesouro R$ 10 bilhões (com mais R$ 20 bi por vir). O congelamento da gasolina asfixia o caixa da Petrobras, que perde valor de mercado, se endivida cada vez mais e fica sem ter como investir no pré-sal. Isso para não falar nas concessões de transportes públicos. Ou alguém por aí acha que as empresas de ônibus vão agüentar por muito tempo a política de preço fixo para as passagens?
3 – Represamento da inflação: Diretamente associado aos dois problemas acima, está o represamento dos índices de inflação. No primeiro caso, mantém-se o dólar artificialmente baixo para não forçar a subida dos preços a ele vinculados. No segundo, mantém-se congeladas as tarifas públicas para não interferir no cumprimento das metas de inflação. O problema é que, mais hora, menos hora, o dólar vai ter que subir e os preços públicos terão de ser reajustados. O Brasil conseguirá cumprir a meta se a inflação represada de dois anos for liberada de uma só vez?
Nesse contexto, bem se vê que o rebaixamento da nota do Brasil não tem qualquer importância imediata. Ele reflete apenas o retrato de problemas que nos fizeram chegar até aqui. Mais importante é discutir o que vamos fazer daqui pra frente. Ganhe quem ganhar ano que vem, receberá uma nau fazendo água por todos os lados. Espera-se apenas que tenha sabedoria suficiente para fazer o que é certo, ainda que ao custo de perda de popularidade.