A farsa das agências de classificação de risco

Faz tempo que eu queria escrever sobre isso. Mas eu gostaria de escrevê-lo só depois de ver Inside job, um documentário feito sobre a crise econômica de 2008, em que se demonstram a empáfia, a arrogância e o non sense do tal “racional mercado”.

O problema é que Inside job virou peça rara nas locadoras das minhas bandas. Vai ver que o pessoal do mercado andou sabotando a distribuição da fita. Quem sabe…

De todo modo, o tema do dia são as agências de classificação de risco.

A cada dia, recebe-se a notícia de que determinada agência de classificação de risco “rebaixou” a nota de alguém, seja de algum país, seja de algum banco, não importa. Os “çábios” economistas que compõem as equipes dessas agências acreditam terem recebido um poder divino para sair por aí dando notas pros outros. Esquecem-se, contudo, de olhar para si mesmos.

As agências de classificação de risco nasceram como uma idéia interessante. Muitos fundos de pensão americanos e europeus, montados em cima de bilhões, tem de investir o dinheiro dos seus cotistas para fazer frente aos gastos futuros com pensões e aposentadorias. Por isso: 1 – o rendimento tem de ser certo; 2 – não pode haver risco de perda de dinheiro.

Com base nessa filosofia de rendimento – ainda que baixo – com risco “zero” de perda, montou-se o esquema das agências. A elas caberia analisar as diversas empresas e países e atribuir uma nota, nota esta que guiaria os investimentos de diversos operadores do mercado, desde fundos de pensões até bancos e títulos de outros países. Disso surgem os “graus” das agências, que normalmente vão de AAA (grau máximo) até D (de default, ou seja, calote certo).

Com base nessas notas, o operador de um fundo teria uma escala para saber onde investir. Se o fundo precisa de mais rendimento, ele pode deslocar parte dos rendimentos de títulos AAA – que normalmente rendem menos – para títulos B, menos seguros, mas com rendimento superior. Isso sem arriscar muito a garantia de solvência dos seus investimentos.

Alguns fundos e as reservas de alguns países (Brasil, por exemplo) só podem ser aplicadas em títulos cuja classificação seja AAA. Daí a bajulação de empresas e países a essas agências de classificação de risco. Ganhar um triplo A significa acesso quase ilimitado ao serviço de crédito mundial. E, quanto melhor a classificação, menores são os juros cobrados e, conseqüentemente, menor é o custo de tomar um empréstimo

E assim caminhava o mundo dos negócios.

Com o tempo, é claro, começaram a surgir as deturpações. As agências de classificação de risco cobravam por suas classificações, evidentemente. E vários bancos contratavam-nas para avaliar o risco de um determinado título que lançariam, vinculando a remuneração das agências à quantidade de títulos vendidos. Assim, a agência ficava, digamos, “propensa” a dar a maior nota possível, pois, quanto mais títulos fossem vendidos, maior seria a sua remuneração.

O conflito de interesses era evidente. Na verdade, havia uma retroalimentação das classificações, movida pela ganância cada vez maior das agências de classificação de risco. Só isso pode explicar como títulos “lixo” (os famosos subprime) recebessem a classificação de AAA. Quando parte do mercado caiu em si, do dia pra noite, quase todos os grandes bancos dos EUA dobraram os joelhos; metade dos títulos que tinham em carteira valiam nada.

E assim sucedeu a crise de 2008.

O que espanta é, depois de assistir e saber de tudo isso, o “mercado” e a “mídia” continuem a dar crédito para elas. Suas palavras valem tanto como uma nota de 3 reais. Como no mercado não há inocentes, só cúmplices, a manutenção da credibilidade das agências certamente intere$$a a muita gente.

Abaixo, o trailer de Inside job. Não assisti ainda, mas, mesmo assim, recomendo.

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6 respostas para A farsa das agências de classificação de risco

  1. Kellyne disse:

    Boa recomendação, vou ver se consigo assistir. Sobre o mesmo tema da crise, já assistiu ao filme Grande demais para quebrar (Too big to fail)? Interessante também! bjos

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