Caos bolsonarista, ou Walking a fine line

Era só o que me faltava.

13 milhões de desempregados, o país afundado no buraco desde 2013, sem nenhuma perspectiva concreta de futuro e gente no campo bolsonarista vêm a público defender o que de pior a ditadura militar produziu, afirmando que “o establishment quer ver Bolsonaro repetindo o AI-5”. Trata-se do velho papo das vivandeiras.

Para quem não conhece, a expressão foi cunhada por Castello Branco. Em 1965, carregando já o fardo de um ano de desgaste presidencial nas costas, o velho marechal cearense tomou o microfone numa palestra. Dirigindo-se àqueles que reclamavam do militarismo de seu governo, Castello pespegou:

“Eu os identifico a todos. E são muitos deles. Os mesmos que, desde 1930, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bulir com os granadeiros e provocar extravagâncias do Poder Militar”.

Bingo. Militar não sai da caserna pra dar golpe se não houver apoio popular por trás. E, por “apoio popular”, entenda-se: classe média unida contra as instituições e empresariado carente de uma “ordem” que lhe permita tocar os negócios pra frente.

Não se sabe se e até que ponto o presidente endossa essa estratégia, mas os sinais de que seu entorno flerta abertamente com o golpismo soam cada vez mais claros. Assessores proeminentes falam em “partir pro pau”, enquanto o guru espiritual de seus filhos prega a “união indissolúvel do povo, Presidente e Forças Armadas”. Enquanto isso, o ex-comandante do Exército sente-se à vontade para tuitar novamente às vésperas de um julgamento do Supremo, “alertando” a Corte para uma “eventual convulsão social” a depender do resultado da deliberação dos ministros.

Talvez seja a hora de se parar e de se pensar. O Brasil passou por um pleito presidencial há pouco mais de um ano. O novo governo mal completou dez meses no cargo. E já tem gente defendendo a ruptura da ordem democrática para impedir “retrocessos institucionais”, a “volta do comunismo” ou coisa que o valha.

Parece claro a essa altura que parte do entorno presidencial joga com base na estratégia do caos. Já se sabia que Bolsonaro rejeitara formar uma coalizão estável com a massa disforme dos partidos de centro no Congresso. O que não se sabia era que ele não estava disposto sequer a contar com seu próprio partido na base de apoio. Depois da batida da PF na casa do presidente do PSL, Luciano Bivar, a agremiação entrou em autocombustão. Além de produzir algo inédito – o partido do presidente obstruir uma proposta do próprio presidente -, rola agora à noite uma guerra de listas pela liderança no partido na Câmara. Ora o líder é Delegado Waldir, ora é o filho 03 do Presidente, Eduardo Bolsonaro. E sabe-se lá quem vai amanhecer na liderança do PSL.

Fato é que, sem maioria no Congresso, e sem algo que possa ser chamado de “retomada econômica” para chamar de sua, os caminhos começam a ficar cada vez mais estreitos para Jair Bolsonaro. O capital político adquirido na eleição esvaiu-se depois da posse entre intrigas e polêmicas inúteis nas redes sociais. A principal proposta até agora – a Reforma da Previdência – deve sua virtual aprovação mais ao empenho de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre do que propriamente à articulação do Governo. E ainda temos três anos pela frente até as novas eleições. O Brasil, portanto, caminha por uma linha muito tênue, espremido entre um governo politicamente desarticulado, uma economia catatônica e um povo cansado de tanto esperar por soluções de Brasília.

Nessas horas, convém sempre lembrar o exemplo francês. Quando a burguesia gaulesa ficou de saco cheio dos revolucionários jacobinos, implorou por alguém que pusesse ordem no galinheiro. Resolveram então chamar um político (Ducos), um abade (Sieyès) e um general para resolver a parada.

O nome dele?

Napoleão Bonaparte.

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