Recordar é viver: “O Dia Internacional da Mulher”

E já que amanhã celebramos o Dia Internacional da Mulher, vamos recordar um dos primeiros posts da seção Variedades.

Porque nunca é demais homenagear aquelas que tornam muito mais prazeroso aproveitar a vida…

O Dia Internacional da Mulher

Publicado originalmente em 8.3.11

Certa vez me chamaram pra fazer um discurso no Dia Internacional das Mulheres.

Oratória nunca foi meu forte. Mas, sei lá por quê, as mulheres que estavam presentes no recinto – todas em torno de seus 40 ou 50 anos – gostaram muito do discurso. Depois do evento, uma delas veio me explicar:

“Foi a primeira vez que vi uma homenagem no Dia Internacional da Mulher que não foi igual ao Dia das Mães”.

Aí caiu a ficha. De fato, muita gente confunde as duas coisas. O dia de hoje não é uma homenagem à mulher-mãe, mas à mulher-gênero, aquela que luta para se afirmar perante nós, homens.

Bom, vou parar por aqui, se não vou acabar escrevendo outro discurso. Aí vai:

“É lugar-comum falar, no dia Internacional da Mulher, sobre o incêndio na fábrica de Triangle Shirtwaist, em Nova Iorque, no qual 129 mulheres foram trancafiadas e queimadas vivas por protestarem melhores condições de trabalho.

Prefiro falar de outro evento, bem anterior, ocorrido na Roma Imperial.

Em discussão no senado, a revogação da Lei Ópia. Essa lei estabelecia um limite à posse de quantidade de ouro pela mulher e proibia-lhe o luxo no vestir. Para pressionar os senadores, as mulheres romanas fecharam as ruas que davam acesso ao Fórum Romano, numa das primeiras – se não a primeira – manifestação coletiva feminina de que se tem notícia.

Dentro do Senado, Catão discursava a favor da manutenção da lei. Dizia ele:

“Presentemente nossa liberdade, vencida por seu caráter passional, aqui mesmo, no Fórum, é despedaçada e calcada aos pés. E, por não termos sabido resistir cada qual à sua mulher, eis que agora tememos a todas. Na verdade, eu consideraria uma fábula, uma ficção, essa supressão radical, numa ilha, dos machos pelas fêmeas conjuradas, pois não existem seres dos quais possam vir maiores males se os deixamos se reunir, deliberar e manter conciliábulos”.

Como o próprio Catão disse em outra ocasião: “O Tempora! O mores!”

Esse discurso, embora antigo, reflete o estado de espírito do homem em relação à mulher ainda nos dias atuais. Criados como complementares, portam-se como antagônicos. Eis a razão: a evolução do macaco ao homem aparentemente não subjugou seu instinto de dominação. O animal ainda se sobrepõe ao humano.

O direito à liberdade de casamento, ao voto, à liberdade sexual e ao trabalho, todas essas foram conquistas impostas pela mulher ao homem. Nenhuma delas veio sem antes enfrentar a oposição ferrenha do homem. Parecia ser demais conceder às mulheres liberdade de pensamento, liberdade de comportamento e independência econômica.

Por instinto, tradição, costume ou coerência, o mesmo espírito de outrora se manifesta nos homens de hoje. O medo, o receio da impotência diante de quem pode tudo, até mesmo conceber a vida, faz cerrar olhos e mente a mudanças, fazendo com que o homem renegue aquilo que constitui a sua natureza e o diferencia dos outros animais: a razão.

Fernando Pessoa dizia que:

‘Se há algo de fato estranho e inexplicável é que uma criatura de inteligência e sensibilidade se mantenha sempre sentada sobre a mesma opinião, sempre coerente consigo própria. A contínua transformação de tudo dá-se também no nosso corpo, e dá-se no nosso cérebro conseqüentemente.  Como, então, senão por doença, cair e reincidir na anormalidade de querer pensar hoje a mesma coisa que se pensou ontem?”

Essa doença é bem conhecida de todos. Chama-se machismo.

E de quem é a culpa por tudo isso?

Não olhem ao redor. Não busquem essa resposta nos compêndios de escola. Como disse Cássio a Brutus: “A culpa, meu caro Brutus, não está nos astros, mas em nós mesmos”.

Os homens, querendo escravizar, acabaram tornando-se escravos de si mesmos.

Aos homens não é permitido admitir que tenham medo. Aos homens não é permitido chorar. A eles não é permitido expressar sua própria sensibilidade. Não passam, portanto, de meio-humanos, porque suportam o peso da culpa do destino passivo ao qual eles condenam suas mulheres. Disso resulta ressentimento oculto e esterilidade do amor, algo que não ocorre entre duas pessoas que se amam, senão entre aquelas que têm entre si um elemento de exploração.

Isso tudo o homem faz na esperança de se sentir livre. Mas o homem somente será verdadeiramente livre quando as mulheres forem totalmente livres para tomar suas próprias decisões sobre suas vidas e sobre a sociedade que as cerca.

Parabéns a vocês, mulheres”.

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