Pela obrigatoriedade do seguro automotivo, ou Uma proposta concreta – Parte VI

Já escrevi aqui por mais de uma vez que aquele ditado jurídico segundo o qual “não é preciso mudar a lei, é preciso mudar a cabeça” é, em certa medida, falso. De fato, há muitas coisas para as quais a mudança legislativa é inócua, como a interpretação de alguns juízes sobre a lei posta. Da mesma forma, há inúmeros casos nos quais a mudança do sistema legal é uma ilusão, simplesmente porque o que está posto até hoje não foi aplicado, como ocorre no nosso sistema penitenciário.

No entanto, casos há em que mudar a lei pode realmente fazer a diferença no caso do cidadão comum. E uma boa sugestão de alteração legislativa é quanto à (não) obrigatoriedade de o motorista possuir um seguro automotivo contra acidentes pessoais.

Como todo mundo sabe, aqui no Brasil não há qualquer lei que imponha ao cidadão o dever de contratar um seguro para poder dirigir seu carro. Basta possuir mais de 18 anos, estar em boas condições de saúde e passar nos exames de direção realizados pelo Detran. Uma vez com a carteira na mão, a Patagônia e o Alasca são os limites.

Em outras países, no entanto, todo motorista é obrigado a contratar um seguro de acidentes pessoais para poder dirigir regularmente. Em Portugal, por exemplo, a contratação do seguro é simultânea à aquisição do direito de dirigir, e o cidadão terá seu direito suspenso caso seja flagrado sem estar com o seguro em dia. Há casos ainda mais radicais, como nos Estados Unidos, em que a falta do seguro pessoal pode levar o sujeito, a depender do estado onde dirija, à prisão, pela simples falta do seguro.

No caso brasileiro, essa idéia chegou pela metade. Instituiu-se o chamado “DPVAT”, conhecido popularmente como “seguro obrigatório”. No entanto, o DPVAT tem alcance restrito, pois está limitado às hipóteses de morte ou invalidez permanente. É dizer: o seguro obrigatório cobre apenas os casos de lesão grave de ordem pessoal. Não entram no pacote os danos causados ao veículo da vítima, nem muito menos os danos sofridos pelo próprio automóvel do condutor.

Fora isso, mesmo nos casos em que o DPVAT indeniza a vítima, o responsável pelo pagamento é o Estado. Assim, a principal função do pagamento, que é impingir ao causador do dano algum prejuízo pelo ato ilícito, acaba se perdendo. No final das contas, o sujeito que sofreu o abalroamento acaba pagando duas vezes: paga pelo seu prejuízo e paga pela indenização despendida pelo Estado, pois todo mundo é obrigado a pagar o DPVAT.

Estabelece-se, assim, um ritual de proselitismo jurídico. O cara que sofreu o acidente entra com uma ação contra o causador do dano, o sujeito – quando é encontrado – é condenado e, na maior parte dos casos, não paga nada, pois já transferiu todo o seu patrimônio a parentes ou laranjas. Além de não haver punição ao mau condutor, abarrotam-se os escaninhos da Justiça com causas de menor importância, que poderiam muito bem ser resolvidas de forma extrajudicial.

Para resolver ambos os problemas, uma simples alteração legislativa daria conta do recado. Bastaria obrigar todo motorista a possuir um seguro pessoal automotivo, contratado a uma das dezenas de seguradoras existentes no mercado. A discussão ficaria apenas quanto aos parâmetros mínimos do contrato de seguro: valor de indenização por danos materiais; valor de indenização por danos pessoais; valor de indenização por danos morais, etc. Para os motorista que transitassem sem seguro, uma dura punição: suspensão da habilitação por um ano e multa no mesmo patamar daquela imposta para quem trafega bêbado.

É uma proposta radical? Talvez. Mas, a considerar pelo panorama atual, é melhor do que o que está aí.

Fica, portanto, a questão submetida à discussão.

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2 Responses to Pela obrigatoriedade do seguro automotivo, ou Uma proposta concreta – Parte VI

  1. Avatar de Paulo de Tarso Campos de Melo Paulo de Tarso Campos de Melo disse:

    Muito bom! Lógica e sensatez. Sugestão aprovadíssima!.

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