Hoje saiu o novo Censo do IBGE. Nas manchetes, a constatação preocupante para a Igreja Católica: nunca antes na história deste país os católicos foram tão poucos.
Desde quando começaram os registros, a quantidade percentual de católicos no país só fez cair. Até aí, nada demais, até porque ter quase 100% de católicos no país como em 1872 só pode ter uma de duas explicações: ou excluíram os negros da pesquisa ou não não foram visitados domicílios em quantidade relevante. Fora isso, salvo onde há repressão religiosa, como em alguns países do Oriente Médio e na China, é natural haver um balanceamento entre as diversas religiões, em que pese sempre haver uma dominante.
O que espanta não é nem tanto a direção, mas o ritmo da queda no número de católicos no país. Desde 1980, quando os católicos ainda eram quase 90% da população, até hoje, quando a quantidade de fiéis da Santíssima Trindade representa aproximadamente 64% da população, a quantidade de católicos reduziu-se em um terço. Pra piorar, pela primeira vez na história o total de fiéis caiu em números absolutos. É dizer: não só o percentual representativo do catolicismo diminuiu no geral, como a quantidade mesmo física de católicos decaiu.
Quais as razões para essa queda tão expressiva do catolicismo no Brasil?
Primeiramente, o avanço das igrejas de orientação protestante. Desde as verdadeiramente corretas, que, embora reneguem alguns dogmas católicos, crêem na salvação por meio de Jesus, até as “neopentecostais”, que asseguram que Deus é o caminho, mas para atravessá-lo você tem que pagar pedágio.
Em segundo lugar, a Igreja Católica carrega um certo estigma da população, que lhe atribui parcialmente a responsabilidade de certos desvios sociais. Na maioria dos casos, trata-se de uma injustiça, porque se um sujeito trai a sua mulher e atribui isso à “hipocrisia do casamento”, a culpa está nele, não no sacramento. É como se, depois de séculos associada ao Estado, a Igreja tivesse de continuar arrostando os males do Governo. Da mesma forma que as pessoas atribuem a responsabilidade de qualquer coisa “ao Governo”, fariam o mesmo com a “Igreja”, maior representação institucional no país depois do próprio Estado.
Isso, contudo, não explica totalmente a queda. Há algo de mais profundo na derrocada católica brasileira. O que faz, por exemplo, um sujeito miserável deixar de ir à missa e acompanhar um culto onde a salvação lhe custa metade de seu salário mínimo?
De certo modo, certas regras da Igreja Católica atrapalham. A falta de padres é decorrência direta do celibato, desestímulo certo para os restantes 99% da população que não consegue enxergar a vida sem sexo. Da falta de padres decorre o abandono espiritual, pois nos rincões mais longínquos, nas periferias, nos bairros pobres, onde está a massa da população que mais precisa de apoio religioso, não há igreja onde o sujeito possa encontrar conforto. Quer dizer, igreja pode até haver, mas padre, não.
É nesse terreno fértil de desperança que pastores inescrupulosos prometem cura e vaga no céu através de pagamento em dinheiro. Para quem está numa tempestade, qualquer porto serve. Para quem não tem nada, qualquer um que chegue com uma oratória grandiloquente prometendo tudo “em nome de Jesus” – carro, casa, viagem ao exterior – será tido como meio de salvação.
Fora isso, a baixa renovação do clero prejudica a qualificação dos padres. Antes exemplos de estudiosos de teologia e filosofia, o nível dos padres católicos tem diminuído bastante. Além disso, a renovação dos quadros da Igreja ajudaria na renovação da mensagem cristã. Ninguém pode conceber que a Igreja ainda condene o uso da camisinha ou da pílula anticoncepcional. Padres mais jovens ajudariam a refrescar o ambiente litúrgico, fazendo com que a palavra transmitida pela Igreja tornasse-se mais palatável à nova geração.
No Sínodo dos Bispos ocorrido em 2005, o Cardeal Dom Cláudio Hummes lançou essa pergunta desafiadora à Assembléia: “Até quando o Brasil será um país católico?”
E, até agora, não houve quem lhe respondesse.