Parece que foi ontem. Estava eu a assistir a TV e, junto com alguns milhares de brasileiros, a torcer por Central do Brasil e Fernanda Montenegro na cerimônia de entrega do Oscar em 1999. Não me lembro exatamente em qual emissora, mas me recordo bem quem era o comentarista da entrega (e aparentemente ele só dá as caras nessa época do ano): Rubens Ewald Filho. Antes da entrega do Oscar de melhor filme estrangeiro, no qual Central do Brasil perderia com certa justiça para A vida é bela, Rubens Ewald Filho – pressentindo o desastre – dizia: “Gente, é só o Oscar”.
A reação natural de qualquer brasileiro, e mais ainda de um adolescente cheio de razão, foi replicar furiosamente contra a imagem na TV: “Como assim, ‘é só o Oscar’?!?”
Para quem cresceu no país com complexo de vira-latas, o Oscar não era somente o mais importante prêmio da indústria cenográfica. Era um verdadeiro passaporte para o Primeiro Mundo. Ganhá-lo seria catapultar ao estrelato um país que se auto-condenara à mediocridade econômica e política. Vencê-lo, enfim, – seja qual fosse o brasileiro vencedor – seria quase uma redenção.
Pouca gente lembrava que o mesmo filme e a mesma atriz ganharam poucos meses antes, respectivamente, o Urso de Ouro e o Urso de Prata do Festival de Berlim nas suas categorias. O que importava era ganhar o Oscar. Se não ganhássemos, era como se tivéssemos perdido tudo.
Suma enganação. O Oscar tem lá sua importância. Mas deve ser-lhe dado a importância devida. Pra começo de conversa, quem escolhe os ganhadores são somente os membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Um seleto clube de aproximadamente 6 mil membros, todos ligados de uma forma ou de outra à indústria do cinema.
Fora as idiossincrasias naturais existentes dentro de um grupo tão restrito – como, por exemplo, alguém votar ou deixar de votar em alguém não por merecimento, mas por afeições ou ódios pessoais – há ainda vários problemas. Há alguns anos, por exemplo, descobriu-se que bilhetes da votação enviados aos membros eram preenchidos por seus empregados domésticos, dada a “relevância” que os atores conferiam à cartelinha onde seria apontados os preferidos da votação. Além disso, os participantes são muito, digamos, “sensíveis” ao lobby da indústria do cinema. Mimos e presentinhos, como direito a viagens ocasionais a paraísos caribenhos são moeda de troca corrente quando um determinado estúdio quer-porque-quer transformar um filme em grande vencedor do Oscar.
Só isso explica, por exemplo, que Charles Chaplin jamais tenha ganhado um Oscar por seus filmes, salvo um Oscar honorário pela carreira. Do mesmo modo, Enio Morricone, o músico responsável pela trilha sonora de filmes como Três homens em conflito e Os Intocáveis só levou pra casa a estatueta de consolação. Isso para não citar casos clássicos, como:
1 – Cantando na chuva, que perdeu o Oscar de melhor filme para O maior espetáculo da Terra;
2 – Apocalypse Now, um dos maiores clássicos do cinema, saiu zerado da premiação;
3 – Mesmo cruel destino para O Sexto Sentido, um dos melhores filmes de suspense de todos os tempos;
4 – O próprio caso de Fernanda Montenegro, que perdeu o Oscar para a insosa Gwyneth Paltrow em Shakespeare Apaixonado (isso para não dizer que ainda havia Cate Blanchett – Elizabeth – e Meryl Streep – Um amor verdadeiro – na parada);
5 – Martin Scorcese, que não levou nenhuma estatueta com suas obras-primas Touro Indomável, Taxi Driver e Os Bons Companheiros, embora tenha ganhado com Os Infiltrados, um bom filme, mas que não chega aos pés dos outros três.
Eu passaria o resto do dia enumerando os casos de injustiças históricas do Oscar. Há livros, revistas e site só com a lista de “Piores do Oscar”. Só isso já bastaria para provar que o prêmio sofre claramente de overrating.
Treze anos e muitos cabelos caídos depois, acho que a ficha caiu. Rubens Ewald tem razão.
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