O surgimento do Deepseek, ou Uma nova batalha que se avizinha

Quem não entende de informática ou não acompanha mercado financeiro deve ter passado batido, mas nesta semana um verdadeiro terremoto balançou as estruturas mundiais, a ponto de indicar inclusive mudanças na Guerra Fria 2.0 travada entre os Estados Unidos e a China. O terremoto atende pelo nome de “Deepseek” (“Busca Profunda”).

Até pouco tempo atrás, o reino da Inteligência Artificial era dominado pelos EUA. A Nvidia – uma empresa originalmente especialista em fabricar placas de vídeo e desenvolver jogos de videogame – tornou-se de maneira quase supersônica a empresa mais valiosa do mundo. Tudo porque os seus chips eram a principal componente da corrida da IA.

Segundo se pensava até a semana passada, nenhum outro país poderia competir com os americanos caso eles detivessem o monopólio dos chips responsáveis pelo processamento da Inteligência Artificial. Por isso mesmo, desde o governo Biden, foi proibida a exportação de chips inferiores a 3 nanômetros para a China. A idéia, por óbvio, era impedir que os chineses tivessem acesso a esse tipo de hardware e, com sua inesgotável capacidade de mão de obra, conseguissem mimetizar o produto a ponto de fabricar um chip igual para chamar de seu.

O problema, como agora se descobriu, é que os estadunidenses estavam lutando a guerra passada. Tal qual a secular briga entre IBM e Microsoft, o que estava desenhada era uma luta entre hardware (os chips da Nvidia) e o software (o programa Deepseek). E, assim como nos anos 80, a vitória foi a do software. O que o programa chinês demonstrou foi que é possível construir um sistema de Inteligência Artificial superior com equipamentos – ao menos em tese – de capacidade inferior. Tudo depende da forma com a qual a arquitetura do modelo foi desenhada.

Apenas para se ter uma idéia da mudança de paradigma embutida na aparição do Deepseek, estima-se que ChatGPT, por exemplo, consumiu US$ 100 milhões de dólares e 16 mil chips especializados da Nvidia na sua “produção”. Já o Deepseek – que é gratuito, ao contrário do ChatGPT – consumiu menos de US$ 6 milhões e apenas 2 mil chips. Como se isso não bastasse, o desempenho apresentado pelo programa chinês tem se mostrado superior ao seu congênere norte-americano.

Não foi por acaso, portanto, que as ações da Nvidia despencaram na segunda-feira, fazendo desaparecer meio trilhão de dólares de investidores em apenas um pregão de bolsa de valores, naquela que é, até agora, a maior destruição de riqueza da história do capitalismo em um único dia. O “Sputnik moment” de segunda-feira abalou o mercado não apenas por demonstrar que modelos de alta performance podem ser desenvolvidos com recursos limitados, mas também por sugerir que a inovação nessa seara pode vir de regiões e empresas consideradas menos competitivas no cenário global.

Engana-se, porém, quem pensa que a coisa pára por aí. O principal objetivo da corrida pela IA não é econômico. É militar. Drones guiados por humanos “lutando” na Guerra da Ucrânia são apenas o começo. Os caças da próxima geração não serão pilotados por seres humanos, mas por máquinas. A guerra do futuro não será muito diferente daquela retratada em filmes como Exterminador do futuro. Serão máquinas contra máquinas. E, como de hábito, quem detiver mais base industrial vai ser a potência militar dominante. A China deu o primeiro tiro e saiu na frente.

Como reagirão os americanos?

Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.

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