Economia é o tipo de coisa que todo mundo quer saber, mas tem pouca disposição para ir atrás. Talvez por isso, boa parte dos çábios de “o mercado” e a curriola restrita dos economistas que são chamados para ditar regras em programas de TV sintam-se tão à vontade para sair falando besteira a torto e a direito. Afinal, não haverá ninguém para contrariá-los.
Como um dos propósitos deste espaço sempre foi traduzir para o vernáculo expressões bonitinhas, porém ordinárias, geralmente usadas para ferrar com a vida da gente, hoje vamos tratar de um desses bichos que parece exótico para a maior parte da população, mas do qual derivam consequências (quase sempre nefastas) para o pessoal do andar de baixo. Falamos, aqui, da tal da curva de juros.
Do ponto de vista prático, a curva de juros estabelece a diferença entre a taxa de juros atual e a taxa de juros estimada em algum ponto futuro (2026, 2030 ou 2035, por exemplo). Se, por acaso, a curva estiver inclinada pra cima, isso significa que “o mercado” espera que a taxa de juros suba ao longo do tempo. Se, ao contrário, ela estiver inclinada pra baixo, isso significa que os agentes econômicos esperam que a taxa caia ao final de determinado período. Para quem tiver alguma dificuldade de visualizar o fenômeno, vai abaixo um gráfico que representa a curva de juros (inclinada pra cima, neste exemplo):

Para a maior parte da população, esse conceito simplesmente não faz sentido. Para o cidadão comum, a taxa de juros é somente aquela definida pelo Banco Central (a famosa taxa Selic, hoje em 10,75% a.a.). O que a galera não sabe é que, no mercado do dinheiro grosso, ninguém negocia empréstimos ou aplicações com a taxa definida pelo BC. Ela serve apenas como referência para as negociações. Se o pessoal de “o mercado” acha que a coisa vai melhorar mais à frente, ela é negociada a patamar mais baixo do que a Selic. Mas, se eles acharem que o negócio vai degringolar em algum momento, o juro fixado será maior do que o previsto a preços de hoje.
Um exemplo prático: quem quiser emprestar dinheiro ao Governo no dia de hoje, receberá da Viúva – caso opte por um título do Tesouro prefixado – 13% ao ano até 2027, quando esse título específico vai vencer. Tendo em vista que a inflação prevista para o ano que vem está estimada em 4%, isso significa que a taxa de juros real está, hoje, em 9% ao ano (13% – 4%).
“E eu com isso?”, deve estar você se perguntando, meu caro leitor.
“Tudo a ver”, respondo eu.
Quem precisa pegar dinheiro emprestado no banco não vai pagar as taxas que o Dr. Roberto Campos Neto fixa nas reuniões do Copom. Vai pagar muito mais que isso. E isso vale não somente para você, pessoa física, mas também para empresas e pessoas jurídicas em geral, que usam crédito para manter o fluxo de caixa e o capital de giro do dia a dia. Logo, se a taxa futura sobe, menos dinheiro sobra para a economia real, onde as empresas investem e os empregos são gerados.
No cenário atual, como o pessoal de “o mercado” resolveu fazer das suas gracinhas e acionou o “modo terrorista” contra o Governo, a inclinação da curva atingiu patamar tão absurdo que, a preços de hoje, a taxa de juros real – isto é, a taxa de juros descontada a inflação projetada para o período – atingiu patamar igual ao do Governo Dilma Rousseff, marcado na história pela “nova matriz macroeconômica” e pelas pedaladas fiscais (cf. imagem abaixo).

O pretexto utilizado pelos çábios para essa posição absolutamente esdrúxula é o suposto descontrole das contas do Governo (o famoso déficit fiscal). O que ninguém dessa camarilha miserável explica é porque os Estados Unidos, com um déficit que é, em proporção do PIB, SEIS vezes maior do que o nosso, começou a baixar os juros na última reunião do FED e já prevê nova queda na próxima reunião. Enquanto isso, o Brasil começou a subir a taxa Selic e, de acordo com a curva de juros precificada por “o mercado”, deve continuar subindo nas próximas.
Ou o Governo acorda para o tamanho do desastre patrocinado por essa gente ordinária e arruma um jeito de colocar ordem no galinheiro, ou daqui a pouco o Brasil de fato vai quebrar, porque nenhum país do mundo consegue sobreviver pagando uma taxa de juros real de 10% ao ano. É esperar pra ver.