Ultimamente, este que vos escreve tem sofrido horrores com os atendimentos em geral. Começando pelos serviços de energia, passando pelos de telefonia, até chegar nos planos de saúde, parece que houve uma conspiração universal contra a paciência alheia.
Daí a lembrança do meu plano maquiavélico de vingança, elaborado há exatos dez anos. Infelizmente, o ardil ainda não foi posto em prática.
Deixo, contudo, a sugestão aos meus 123 leitores para que tomem de emprestado a sugestão, aplicando-a com a coragem que até agora faltou ao signatário.
É o que você vai entender, lendo.
Crônica de uma vingança imaginária
Publicado originalmente em 4.2.14
Esta crônica é baseada numa história irreal.
Consumidor incauto prepara o almoço em casa. Súbito, toca o telefone.
“Alô, pois não?”, fala o consumidor.
“Bom dia, eu gostaria de falar com o senhor Fulano”, diz a atendente do outro lado da linha.
“É ele”.
“Sr. Fulano, o motivo do meu contato é para tratar do pagamento da mensalidade de sua TV a cabo”.
“Pagamento da mensalidade da TV a cabo?”
“Sim, consta no sistema que sua mensalidade não foi paga”.
“Aguarde na linha, por gentileza”.
No rádio, toca Für Elise. O consumidor aumenta o volume.
5 minutos depois:
“Sim, pois não?”
“É o Sr. Fulano?”
“Sim, é ele”.
“É a respeito da fatura de sua assinatura da TV a cabo”.
“Sim, qual o problema?”
“Consta no nosso sistema uma fatura em aberto”.
“Ah, sim. Deixe-me verificar, por favor. Aguarde um momento, por gentileza”.
Na rádio, Für Elise toca em loop contínuo. O camarada aumenta o volume novamente.
5 minutos depois:
“‘Sênhóra’ (assim mesmo, com a voz anasalada), eu estou verificando aqui que o pagamento da TV a cabo se dá por débito automático na fatura do meu cartão de crédito”.
“Sim, senhor, mas acontece que a fatura aqui está constando como em aberto”.
“Eu lamento, ‘Sênhóra’, mas o meu sistema aqui indica que o pagamento foi efetuado”.
“Ma…Ma…Mas o meu sistema aqui está informando que não foi feito o pagamento”.
“Então, ‘Sênhóra’, deve ter ocorrido algum problema. Aguarde um momento na linha que eu vou estar consultando o setor responsável”.
Nem Beethoven aguenta mais Für Elise . Mas ela segue tocando no rádio.
5 minutos depois:
“Sim, em que posso ajudar?”
“Meu senhor, eu já lhe disse. É sobre uma fatura em atraso de sua TV a cabo”, responde exasperada a mulher.
“Ah, tá. Só um instante, por favor”.
O consumidor aperta com força algumas teclas de seu computador. 30 segundos depois, volta à linha.
“‘Sênhóra’, eu estive verificando aqui que houve uma divergência no sistema. Por isso, vou precisar abrir uma ocorrência”.
“Senhor, não há divergência no sistema! Eu já disse! A fatura não foi paga! Está aqui a tela aberta na minha frente dizendo que a fatura não foi paga!”, argumenta em desespero a atendente.
“‘Sênhóra’, eu peço que a ‘sênhóra’ se acalme. O seu sistema não diz que está em aberto?”
“Sim!”, responde impaciente a atendente.
“Pois o meu sistema diz que está pago. Daí a divergência. Por isso, vou ter que estar abrindo uma ocorrência para verificar”.
“….”
“‘Sênhóra’, a ‘sênhóra’ ainda está na linha?”
“Sim”, diz a atendente, já com certo ar de desdém.
“Eu vou precisar confirmar alguns dados por questão de segurança”.
“Dados?!?”
“Sim. Nome completo, CPF, matrícula e data de admissão na empresa, por favor”.
“Ma..ma…mas meu senhor, eu não estou autorizada a dar esse tipo de informação por telefone”.
“Eu preciso desses dados para abrir a ocorrência, ‘Sênhóra’”.
“Mas a empresa não me autoriza a a dar esse dados, senhor”.
“Por razões de segurança, a ligação será descontinuada, ‘Sênhóra’. Algo mais em que posso ajudá-la?”
“Ma…ma….ma….ma….”
“Boa tarde”.
Tu-tu-tu-tu-tu-tu….