Intimidade é um negócio curioso. Todo mundo tem, mas são raros aqueles que consentem em partilhá-la. Mesmo entre marido e mulher existe uma reserva de privacidade inexpugnável, e há casais que jamais verão um ao outro dentro do banheiro. Nada de mal há nisso. Pelo contrário. É até comum e saudável que assim seja.
Mas no carnaval a coisa é diferente. Certos “luxos” da vida privada acabam tendo de ser jogados a segundo plano. Do contrário, é rala a chance de você conseguir usufruir alguma coisa do período momino. E quando o sujeito é adolescente e liso, aí é que a reserva de intimidade vai pro espaço. Foi o que aconteceu com Daniel.
Liso por natureza, mão-de-vaca por opção, Daniel queria porque queria ir naquele carnaval para a praia mais badalada daquele verão. Como a grana lhe faltasse, reuniu-se a contragosto com um grupo de amigos mais ou menos da mesma idade. O objetivo era repartir o aluguel de uma casa minimamente confortável, de maneira a diminuir as privações inevitáveis de quem resolve passar o carnaval no concorrido litoral baiano (como a falta de água a partir da segunda noite dos festejos). Irmanados no mesmo objetivo, doze adolescentes mal entrados na puberdade tomaram um ônibus e o rumo da praia. Carnaval era o seu destino e esbórnia, a sua missão.
A casa, como esperado, não era das piores, mas estava longe de ser das melhores. Dotada de um tanque de plástico ao qual o dono resolveu dar o nome de “piscina”, a residência comportava mal e mal dois casais. Havia dois quartos, uma pequena cozinha e uma varanda que dava para a beira-mar. A sala podia parecer ampla, mas para abrigar o restante daqueles que, por sorteio, deveriam dormir nela, tornara-se claustrofóbica.
O pior, contudo, não era isso. Entre os 150 e poucos metros quadrados da habitação, havia apenas um – UM – banheiro. Que seria repartido entre doze – DOZE – adolescentes. Durante o Carnaval – CARNAVAL.
Houve quem se desesperasse, mas Daniel manteve-se impávido. Talvez movido pelo instinto, sabia ele que aquelas condições eram as melhores que seu bolso poderia comportar. Resignado, arrumou seu colchonete na sala e dormiu na primeira noite o sono dos justos.
Na manhã seguinte, acordou um pouco mais tarde do que de hábito, muito por conta do barulho dos demais, que já se encontravam despertos. Ao ouvir o chamado da natureza, foi buscar calmamente na sua mochila uma daquelas revistas semanais que não servem para nada, salvo para acudir nesse momentos.
Cientes de que a continência numérica de banheiros impunha restrições ao seu uso regular, um dos convivas resolveu interpelar delicadamente Daniel:
“Vai ao banheiro?”
“Sim, vou”, respondeu calmamente Daniel.
“Pra fazer o quê?”, insistiu já indelicadamente o amigo.
“Vou ‘tomar banho'”, respondeu Daniel, fazendo com as mãos o gesto das aspas aéreas.
E foi assim que Daniel mostrou pra todos que, mesmo no carnaval, é possível resguardar um pouco da sua intimidade.