O Brasil pós-eleição

Voltando ao batente aqui no Blog, vamos retomar a pauta que ficou represada pelo período de ausência. E, no topo da lista, um item incontornável: o Brasil pós-eleição.

Que esta campanha foi a mais suja desde a terrível corrida eleitoral de 1989, ninguém contesta. Golpes baixos de lado a lado, calúnias difundidas nas redes sociais e marquetagem barata travestida de informação tornaram o verbo “desconstruir” o grande vitorioso dessas eleições. No meio de tudo isso, uma população atarantada, nem sempre inteiramente consciente dos fatos que se apresentavam perante si, ficava sem saber para onde ir.

Como não poderia deixar de ser, de uma disputa tão acirrada só poderia emergir um país dividido, fraturado até a medula, com dois pólos antagônicos trabalhando no limite da irresponsabilidade. Diante de tal cenário, negar a profunda divisão do Brasil não significa somente uma espécie de autoengano, mas antes um arriscado exercício de temeridade. A questão, no fundo, não é saber que o país está dividido, mas entender como essa divisão deve evoluir nos próximos quatro anos.

À primeira vista, não há razão para acreditar em um distensão política no curto prazo. Uma vez que a presidente Dilma emendará um mandato no outro, levando o PT para o quarto consecutivo, nem mesmo aquele curto período de dois meses entre o segundo turno e a posse significará trégua por parte da oposição. Isso porque ela parece ter finalmente descoberto o óbvio: oposição que não faz oposição não ganha eleição.

À segunda vista, tampouco parece crível pensar em um ambiente mais desanuviado no médio prazo. Visto que o cenário político depende fundamentalmente do panorama econômico, não há razão para imaginar que um país em recessão técnica, a alimentar a perspectiva de um 2015 ainda pior do que 2014, possa distender naturalmente o clima envenenado que permeou a campanha eleitoral.

Diante da possibilidade de manutenção do atual cenário de conflagração por um tempo maior do que o esperado, resta saber de quais armas se valerão Governo e Oposição para dar continuidade ao enfrentamento.

Do lado oposicionista, o caminho foi o pior possível. Grupelhos saíram às ruas para pedir o impeachment de uma presidente cujo mandato nem sequer começou. Parte mais radical achou isso pouco e estendeu faixas reclamando “Intervenção Militar Já”, como se militar derrubando presidente resolvesse pelo menos o engarrafamento da Av. Santos Dumont.

Como desgraça pouca é bobagem, o pedido de auditoria do resultado eleitoral pelo PSDB só ajuda a conspurcar ainda mais o cenário. Ao dar azo a teorias conspiratórias que só prosperam em ambientes como o Facebook, o maior partido que se contrapõe ao PT arrisca-se a desmoralizar a oposição antes mesmo de o segundo mandato da Dilma começar.

Do lado situacionista, também é difícil vislumbrar algum gesto na direção do apaziguamento político. Agora que a tese do “nós contra eles” mostrou novamente sua eficácia, não há porque imaginar que o PT abandonará a linha de apostar na divisão do país como tentativa de manter sua força eleitoral. Sob essa perspectiva, é mais fácil pensar numa guinada ainda mais à esquerda no segundo mandato do que numa virada prudente para a centro-direita, inclusive no aspecto econômico. Não precisa ser nenhum Nostradamus para imaginar que isso só servirá para acirrar mais os ânimos, não para acalmá-los.

Ao contrário do que pensa parte dos analistas, não há razão para temer uma desestruturação institucional do país. Para que um golpe tenha lugar, é necessário o apoio das Forças Armadas. “Graças” aos 21 anos de ditadura, a alternativa militar é, hoje, carta fora do baralho.

Mesmo assim, convém não subestimar o acirramento das disputas políticas. Afinal, em um país desigual como o Brasil, com tantas contradições como o Brasil, manter aceso o pavio pode cindir ainda mais o já frágil tecido que mantém coesa a sua sociedade.

Porque, do radicalismo e da cizânia, boa coisa é que não vem.

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