Um embate tem se tornado tradição no Brasil das últimas décadas: aquele promovido entre as forças petistas e a chamada “grande imprensa”. Antes acusada de serem “entreguistas” e “chapa-brancas”, os grandes jornais e as redes de TV passaram a ser acusados de participar de uma grande conspiração para derrubar o governo “democrático e popular” instaurado pelo PT. Nasceu, então, a designação do Partido da Imprensa Golpista, o popular PIG.
Evidentemente, a escolha do nome tem tudo a ver com o acrônimo que o representa. Afinal, PIG, em inglês, é o vocábulo designativo do porco. E, tanto no inglês quanto no português, a palavra pode ser empregada no seu sentido denotativo (o suíno) ou conotativo (o escroque, o safado).
Como reducionismo pouco é bobagem, parte das hostes antipetistas resolveu pagar na mesma moeda. Utilizando-se da mesma sigla, criaram o Partido da Imprensa Governista. Finalmente, o Fla x Flu político chegara à mídia, com dois lados torcendo apaixonada e irracionalmente por seu time, embora seja difícil saber quem é quem no embate entre PIG x PIG.
Não me interessa, aqui, saber quem tem razão, nem de um lado, nem de outro. Interessa-me, na verdade, discutir algo que sempre passou ao largo das análises políticas no país: a declaração de voto dos veículos de imprensa.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os jornais de grande circulação e as grandes redes já adotaram desde há muito a prática de declarar o voto. Quando vem uma nova eleição, eles aguardam mais ou menos um mês e depois assumem o candidato de sua preferência. Dessa forma, o leitor pode saber qual a tendência do periódico e deixar-se influenciar, positiva ou negativamente, pelo apoio declarado.
Em alguns casos, é óbvio, a declaração de voto é um ato meramente protocolar. Todo mundo sabe que o New York Times vota com os democratas, assim como todo mundo sabe que o Wall Street Journal vota com os republicanos. Do mesmo modo, quem acompanha a CNN sabe da predileção de seus editores pelos liberals, ao passo que quem acompanha a Fox News está careca de saber a tendência conservative do seu noticiário.
Aqui no Brasil, no entanto, a moda nunca pegou. Desde sempre, a mídia declara-se “neutra” ou, na melhor das hipóteses, “imparcial”. As grandes redes até montam estratégias aritméticas para demonstrar sua isenção na disputa, como cronometrar o tempo concedido aos principais candidatos em seus telejornais. Pode parecer algo elevado, mas, no fundo, só quem perde com isso é a democracia brasileira.
Pra começo de conversa, não existe veículo no país que não tenha suas preferências eleitorais. Embora se possa argumentar que a instituição, como pessoa jurídica, não tem partido, todos os seus jornalistas e editores os têm. Quando esses mesmos veículos e jornais resolvem omitir suas predileções em nome de uma suposta “isenção de cobertura”, na verdade o que fazem é induzir os leitores/telespectadores a pensar que não há por trás de cada matéria uma inclinação em favor de determinado candidato.
Ficaram famosa, por exemplo, as edições do Jornal Nacional das eleições de 1989. Assim como agora, assegurava-se a cada candidato o mesmo tempo de exposição no maior telejornal do Brasil. Uma coisa, contudo, era mostrar 30 segundos de Ulysses Guimarães consultando-se com um médico para saber se tinha apendicite. Outra, bem diferente, era mostrar Fernando Collor de Mello nadando numa piscina de raia olímpica e exibindo seus “dotes” na TV.
Ocorre que, com esse pacto tácito pelo farisaísmo, o eleitor desavisado acaba sendo induzido a erro. Por exemplo: um sujeito mais esclarecido tem a clara noção de que a revista Veja é tucana. Do mesmo modo, quem conhece a sua linha editorial sabe bem que a Carta Capital é petista. Mas, como nem todo mundo tem tal nível de discernimento, muitas matérias tendenciosas – para um lado e para o outro – acabam se misturando ao bolo da “isenção jornalística”, como se todas as reportagens fossem produzidas de maneira apartidária.
Na verdade, seria muito mais correto e honesto se os veículos de comunicação declarassem desde o início os candidatos de suas preferências. Poderia não mudar nada na disputa, mas pelo menos o eleitor seria poupado de boa parte da hipocrisia que costuma reinar durante a corrida eleitoral.
poderia não mudar a disputa, mas o eleitor com menos discernimento (parafraseando o texto) saberia que revista tal iria atacar tal partido e defender o outro. sabendo disso, teoricamente, o individuo acessaria mais textos para saber os prós e contras de cada um. isso acredito eu, afinal até eu tenho umas crises de otimismo em relação ao ser humano.
Você está muito fatalista, Rômulo. Vamos acreditar na evolução do ser humano, hehehe. Um abraço.
Concordo com a ideia central do texto. Seria muito mais produtivo e benéfico para o embate eleitoral e o processo politico brasileiro. Como foi dito no último parágrafo conviveríamos com uma hipocrisia a menos. Ademais, como gosto de uma polemica, confesso que gostei de identificar nas entrelinhas do primeiro parágrafo, repleto de termos aspeados, certa contrariedade do nobre articulista em vir os petistas como vanguarda do debate politico e da luta pelos interesses nacional, bem como em reconhecer o governo petista como verdadeiramente democratico e legítimo representante das classes sociais menos favorecidas, afirmativa, última, incontestável, a não ser que queiram desconsiderar s avaliação da ONU divulgada hoje.
O “vanguarda do debate político” (olhas as aspas aí de novo!) vai por conta inteiramente sua, meu caro. Como todo mundo que escreve sabe, o grande problema da ironia está no risco de você ser mal compreendido. Aconselho uma nova leitura do texto, apenas para extirpar qualquer possibilidade de compreensão equivocada, hehehe. Um abraço.