O imbróglio do caso Diego Costa

O penúltimo bafafá do mundo do futebol envolve o atacante brasileiro Diego Costa. Convocado por Felipão para os próximos amistosos da seleção contra Honduras e Chile, Diego Costa recusou a convocação e disse que, daqui por diante, defenderá apenas a camisa da Espanha. Foi o suficiente para detonar uma reação ufanista e raivosa como poucas vezes se viu por estas bandas.

Para resumir a história a quem ainda não a conhece, Diego Costa saiu do país ainda muito novo, com apenas 18 anos. Hoje, com 25, faz sucesso no Atlético de Madrid, sendo o artilheiro do Campeonato Espanhol, à frente de gênios como Messi e Neymar e posers como Cristiano Ronaldo. Para um esporte cujo objetivo é enfiar a bola na rede, convenhamos, não é pouca coisa.

O problema é que, em março deste ano, Diego Costa fora convocado por Felipão para participar de dois amistosos, contra a Rússia e a Itália. Entrou, jogou no total menos de meia hora, e não fez lá muita coisa. Talvez por isso, não foi lembrado por Scolari nas convocações seguintes. Somente agora, quando surgiram rumores nos bastidores de que a Espanha, atual campeã mundial, iria convocá-lo para seu escrete, Diego Costa voltou à pauta da Canarinho.

O imbróglio maior gira em torno de uma brecha nas regras da Fifa. Em princípio, um jogador que jogue por um determinado país não pode defender nenhum outro. A regra era antiga e serviu para impedir a repetição de casos como o de Mazolla – campeão pelo Brasil em 1958 e defensor da Azzurra em 1962 – e Puskas – líder do quase imbatível escrete húngaro de 1954 e jogador da Espanha na Copa de 1962.

No entanto, uma fresta aberta recentemente desconsidera os amistosos para efeito de “perpetuação” da ligação do jogador ao país. Com isso, mesmo tendo jogado pelo Brasil contra Rússia e Itália, Diego Costa ainda pode ser convocado pela Espanha para defender as suas cores.

Do ponto de vista pessoal, ninguém pode criticar Diego Costa por escolher jogar pela Fúria. O sujeito cresceu na Espanha, trabalha na Espanha, é reconhecido na Espanha, tem mais é de querer jogar pela Espanha, mesmo. Como dizia Sócrates, “não sou grego nem ateniense, mas um cidadão do mundo”. Messi, por exemplo, foi para o Barcelona com 13 anos. Nunca mais saiu de lá, mas nem por isso quis deixar de defender a seleção argentina. Se Diego Costa tomou caminho diferente, paciência; os seus compatriotas nada têm a fazer senão o apoiar na iniciativa.

O imbróglio ganhou contornos tragicômicos quando a CBF falou em “cassar” a cidadania brasileira de Diego Costa como forma de puni-lo pela opção de jogar pela Fúria. Além de responder com o fígado, a CBF mostrou profundo desconhecimento da Constituição, porque brasileiro nato não perde a condição de brasileiro pela tão-só opção de obter outra nacionalidade.

É piada a tentativa de transformar a decisão de Diego Costa em “traição à Pátria”. Fazendo-se isso, eleva-se Diego Costa e o próprio futebol a um patamar que eles simplesmente não merecem. Nem Diego Costa é o maior atacante da atualidade, nem muito menos o futebol deve ser tratado com assunto de Estado. Se ele quer jogar pela Espanha, ótimo. Como disse Fernando Meligeni, que faça carreira e seja bem feliz por lá.

O problema dessa patriotada é desviar a atenção para o que deveria ser o ponto principal da discussão: a estúpida regra da Fifa que desconsidera amistoso como evento oficial para efeito de vinculação do jogador a determinada seleção. Se de fato amistoso não vale pra nada, poderíamos cair na esdrúxula situação de ter um jogador representando, em sequência, várias seleções em um mesmo ano.

Imagine, por exemplo, um sujeito convocado para um amistoso pelo Brasil. Entra, joga, mas não faz bom papel. É esquecido, mas um mês depois volta a fazer sucesso. É convocado, então, pela Itália. Entra, joga, é expulso e faz um gol contra. Vira cão danado e queima seu filme com os italianos para sempre. Dois meses depois, transfere-se para a Inglaterra e redescobre seu talento. Termina o ano como titular da seleção inglesa e referência do time.

Trata-se de um exemplo extremo, mas, pelas regras atuais, inteiramente possível. Com essa maluquice, corre-se o risco de cair-se numa situação na qual os países cujos times são os mais endinheirados do mundo – Espanha, Itália, Reino Unido e Alemanha – acabem “recrutando” jogadores do exterior para reforçar suas respectivas seleções. Com o tempo, chegaremos na situação em que as seleções nacionais serão compostas da mesma forma como o são os times desses campeonatos: 90% de estrangeiros naturalizados e 10% (na reserva) de cidadãos natos.

Ao invés de fazer humor com a opção de representar uma seleção estrangeira, a CBF deveria estar pressionando a Fifa pela mudança das regras. Como advertiu o PVC, nacionalidade não se vende.

Esse deve ser o espírito da discussão.

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