O salário dos vereadores

Em época de eleições, muitas coisas vêm à tona. A maior parte é cascalho. Outra grande parte é bravata de campanha destinada a barganhar alguns votos. Enquanto isso, muitas questões relevantes acabam passando em branco durante o período eleitoral. E uma delas é bem pertinente: a remuneração dos vereadores.

Como todo mundo sabe, os municípios possuem uma câmara, cuja missão é fazer as vezes de um Poder Legislativo municipal: propor, votar e aprovar leis, e fiscalizar o exercício do ocupante do Executivo (no caso, o prefeito). São os vereadores, portanto, que fazem o papel de “deputados municipais”.

Até aí, tudo bem. A última coisa que a gente poderia querer seria um “ditador” municipal, apto a fazer o que bem entendesse sem fiscalização de quem quer que seja. Mas a questão da remuneração acabou por deturpar a idéia de um poder fiscalizador nos municípios.

Até 1975, somente os vereadores das capitais e dos municípios com mais de 200 mil habitantes recebiam salário. Os demais poderiam receber algum tipo de verba indenizatória (despesas com transporte, alimentação e viagens), mas não recebiam qualquer contrapartida financeira pelo exercício do mandato.

A razão de ser era simples: impor o gasto com os salários dos vereadores a municípios pequenos, que em sua maioria dependem exclusivamente das verbas repassadas pela União e pelos Estados, seria uma despautério. Contando com parco orçamento, os municípios não poderiam dar-se o luxo de gastar qualquer quantia com a remuneração da vereança. Além disso, nos municípios pequenos, não há tanta atividade legislativa assim que justique a dedicação em tempo integral ao mandato. Tanto é que os vereadores podem manter suas atividades profissionais em paralelo ao exercício parlamentar. Pagar-lhes remuneração seriam, ao fim e ao cabo, mero desperdício de dinheiro público.

No entanto, desde a mudança constitucional em 75, a câmara de vereadores tornou-se um fardo extremamente pesado no orçamento de vários municípios por aí. Há casos de cidades com pouco mais de 10 mil habitantes, que possuem 8 vereadores ganhando a bagatela de R$ 7 mil por mês. Enquanto o dinheiro é sorvido com o pagamento dos edis, falta na outra ponta para contratar médicos, professores e funcionários.

Não à toa, começam a se formar “castas” eleitorais nas pequenas cidades. Os vereadores apóiam o prefeito, que apóia o deputado, que apóia o governador. Na linha contrária, o governador apóia o deputado, que apóia o prefeito, que apóia o vereador. Nessa via de mão dupla, constrói-se uma perversa lógica secular segundo a qual todos apóiam todos, de modo que se perpetuem no poder. Sim, os políticos profissionais nascem nas pequenas cidades, e acabam deturpando o sentido mesmo da atividade política.

Pra piorar, justamente por conta da estrutura digamos, “generosa”, desse sistema, os municípios no Brasil têm se multiplicado como coelhos. Na época da reforma de 75, o Brasil tinha menos de 4000 municípios. Hoje, tem mais de 5500, caminhando a passos largos em direção aos 6000.

Já há na Câmara dos Deputados diversas propostas querendo limitar ou mesmo extinguir o salário dos vereadores. É o tipo de tema que nunca é lembrado e muito menos vai pra frente durante o período eleitoral.

E, infelizmente, nem depois.

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