Ontem, o presidente da França e candidato à reeleição Nicolas Sarkozy aprontou mais uma das suas. Num comício de campanha, ameaçou retirar a França do Tratado de Schengen se “nada fosse feito” para conter a “invasão de imigrantes à Europa”.
Antes de comentar a notícia, é necessário explicar o que é o Acordo de Schengen. Schengen é um pequeno vilarejo de Luxemburgo, perto do qual se assinou um tratado segundo o qual toda a Europa aboliria as fronteiras entre si. Ao contrário dos turistas de antigamente, em que o imigrante era obrigado a carimbar um passaporte a cada mudança de país na Europa, agora a providência seria dispensável. É dizer: quem entra agora num país Europeu, entra em toda a União Européia. O único que ficou de fora – pra variar – foi o Reino Unido.
Pois bem. É justamente contra esse tratado que investe Sarkozy. Atrás nas pesquisas e com sua aposentadoria precoce da política cada vez mais próxima, Sarkozy tenta de todas as maneiras reverter o quadro desfavorável atraindo aquela parcela mais detestável do eleitorado europeu: a direita racista e xenófoba. Isso, claro, explica o discurso, mas não o justifica.
O problema da Europa não são os imigrantes. Nunca foram, aliás. A atual crise econômica decorre de políticas bem européias, na verdade, como o gasto desenfreado com despesas supérfluas e a incapacidade de promover uma política tributária condizente com o Estado Social Europeu.
Sarkozy não está só. Que o digam os brasileiros que sofrem, por exemplo, na imigração espanhola, tratados como estorvos e deixados num cubículo de 30m2 com outras 50 pessoas, sem direito a cama, banho e comida decente. Recentemente, o governo brasileiro resolveu acordar para o problema e passou a tratar os espanhóis com “reciprocidade”.
Na verdade, a tentativa de colocar a culpa nos imigrantes não passa de uma farsa destinada a aplacar o ressentimento de uma parcela minoritária do eleitorado europeu, inconformada com a perda de qualidade de vida e a acostumada a pensar que a Europa é o centro do mundo, com o resto do planeta fadado a servir-lhe de colônia. Em vez de levantar, sacodir a poeira e dar a volta por cima, essa parcela do eleitorado prefere achar um culpado para a sua situação. É aí que entra o imigrante.
Sem voz política e sem poder econômico, o imigrante apanha calado. É justamente isso que faz dele um bode expiatório tão atraente. Bate-se com gosto e o outro lado não tem capacidade de responder.
Submetido muitas vezes a condições de trabalho que deixariam de cabelo em pé qualquer um, o imigrante sujeita-se a fazer um tipo de serviço para o qual o europeu tradicional não se anima nem deseja se apresentar. Por isso mesmo, o raciocínio que pretende imputar-lhes a responsabilidade pela crise européia é capenga. Imigrante não tira emprego de europeu. Tira emprego de outro imigrante, que ganhava um pouquinho mais.
Quem promove a “implosão da Europa”, portanto, não são os imigrantes. São os políticos que pretendem transformar aquilo que a Presidente Dilma Roussef chamou de “patrimônio cultural da humanidade” num antro de xenófobos.
Sarkozy deu um prazo para a imigração parar: 12 meses. Em 12 meses, no entanto, espera-se que ele não ocupe mais o Eliseu, e políticos europeus de seu naipe aprendam que, para cuidar dos problemas dos seus países, não precisam encontrar bodes expiatórios. Precisam é trabalhar.
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