O motim baiano, ou o Estado de Direito em xeque

Desenrola-se na Bahia, berço da nação brasileira, o mais novo atentado à democracia brasileira. Deram-lhe o nome de “Greve da PM”. De início, subtraiu-se da população o sacrossanto direito à segurança pública. Como se isso não bastasse, policiais com mandados de prisão em aberto resolveram ocupar um dos poderes do Estado (a Assembléia Legislativa), impedindo-o de funcionar. É pouco? Trouxeram as mulheres e os filhos para servirem de escudo contra uma eventual incursão da tropa do Exército.

Pra começo da conversa, o que está acontecendo na Bahia não é greve, pelo simples fato de que não é dado a policiais militares o direito de fazê-la. Ainda que alguém defendesse alguma forma de manifestação reivindicatória por parte dos amotinados, ninguém em sã consciência defenderia tal direito para PM´s armados, tomando quartéis, roubando viaturas da polícia e impedindo um dos poderes estaduais de funcionar.

Quando o Estado de Direito – expressão maior do poder popular – é ameaçado por uma tropa armada, o nome disso é motim, não greve. A favor deles não há sequer o benefício da coragem. Brandir músculos e palavras de ordem é fácil quando as mãos carregam armas semi-automáticas. Botar a cara a tapa e sair em passeata, sujeitando-se aos cassetetes de que tanto a polícia gosta de usar contra manifestantes, nem pensar.

Em 1997, correu no Brasil uma onda semelhante. Em Minas Gerais, com Eduardo Azeredo, e na mesma Bahia, com César Borges, os poderes do Estado capitularam diante da tropa amotinada. Quando foi a vez do Ceará, Tasso Jereissati resolveu mudar a história. Os amotinados ameaçavam marchar até o Palácio da Abolição, que abrigava a sede da Secretaria de Segurança Pública. Tasso mandou avisar: do Hotel Esplanada, a dois quarteirões do Palácio, não passariam. Os rebelados pagaram pra ver. De prontidão, as tropas leais ao governo abriram fogo contra os amotinados. Houve tiros e feridos. Mas do Hotel Esplanada não passaram. Jogo jogado.

Assim como em 1997, a melhor coisa a fazer-se contra uma tropa amotinada é tratá-la com manda a lei: prisão e, em caso de resistência, uso da força. Quando bandidos – repetindo: BANDIDOS -armados resolvem chantagear os poderes instituídos em nome de aumento salarial, negociar com eles significa uma dupla ofensa à ordem democrática. De um lado, dos policiais que usam o medo da população como artifício de pressão sobre representantes eleitos. Do outro, dos políticos que aceitam a submissão de sua autoridade quando colocados contra a parede por um movimento declarado ilegal pela Justiça.

 Óbvio: ninguém deseja um banho de sangue. Isso não implica, contudo, a autorização para negociar com os rebelados. Quando policiais militares invadem a Assembléia do Estado e recusam-se a sair, sabem que estão comprando um risco. Se as autoridades instituídas não pagarem pra ver, e ainda aceitarem as reivindinções (com direito a anistia para os crimes cometidos), o distinto público passa a encarnar o papel de palhaço.

Nesse caso, a conduta do Governo da Bahia não poderia ser mais exemplar. O Governador foi a público tentar tranqüilizar a população, chamou ajuda federal e, aos trancos e barrancos, está tentando sair da situação. Em momento algum surgiu qualquer sussurro de que tenha tentado entrar em algum tipo de acordo com os rebelados, muito menos em termos de anistia para os crimes cometidos.

Espera-se sinceramente que a greve se resolva sem (mais) mortes. Roga-se, entretanto, que seu fim não seja à custa da autoridade do Estado sobre sua população. Tal desfecho seria ainda pior do que prolongar por mais alguns dias a agonia da população. Vamos ver no que isso vai dar.

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