As mudanças no sistema parlamentar britânico

Em continuação ao post anterior, e também para que não me acusem de ser tradicionalista, reacionário, monarquista, ou alguma baboseira do gênero, vou falar um pouco das mudanças que houve e as que certamente virão um dia no sistema britânico.

Como já explicado no outro post, o sistema britânico é um tanto sui generis. Nele, o Parlamento é pau pra toda obra: Executivo, Legislativo e Judiciário. Duas são as casas: Câmara dos Comuns (representantes eleitos do povo) e Câmara dos Lordes (representantes da nobiliarquia e do clero, não eleitos). Hoje, a proeminência política é sem dúvida da Câmara dos Comuns. Mas nem sempre foi assim. Vamos voltar um pouquinho no tempo.

Antes do fim do absolutismo na Europa – com a Revolução Francesa – e antes mesmo até das formações dos estados nacionais europeus – por volta do século XV, começando por Portugal -, a Inglaterra já limitara os poderes do rei. Revoltado com João Sem Terra, os ingleses o forçaram a assinar uma carta em que assumia uma série de obrigações relacionadas aos direitos civis. A essa carta deu-se o nome de Magna Carta, porque fora escrita em latim.

Nessa época, já havia parlamento na Inglaterra, mas seu papel era meramente decorativo. Foi a Magna Carta que lançou as bases do que viria a seguir.

É da Magna Carta, por exemplo, o surgimento do conceito de devido processo legal. Muitos consideram a Magna Carta a precursora das constituições modernas.

Mesmo com a Magna Carta, o rei ainda mandava muito. Não chegava a ser um absolutismo clássico, mas a figura do rei era central na política britânica.

Em 1322, foi definido que o Parlamento seria dividido em duas casas: Câmara dos Comuns e Câmara dos Lordes. Os primeiros seriam eleitos pelo povo. Os segundos, indicados pelo soberano.

Evidentemente, estruturaram-se as funções de modo a que a Câmara dos Lordes tivesse mais poder do que a Câmara dos Comuns. E, evidentemente, era questão de tempo até essa situação mudar.

Depois da Guerra Civil Britânica, o destronamento e a execução de Charles I e a ascenção de Cromwell como ditador, a Câmara dos Lordes passou a mandar em nada. Chegou até a ser extinta por um breve período, de 1649 a 1660. Posteriormente, com a restauração da monarquia, a Câmara dos Lordes voltou a existir. Mas as coisas não seria mais como antes. A Câmara dos Comuns era agora a grande estrela da companhia.

Por muito tempo, as vagas na Câmara Alta foram vitalícias e hereditárias. Os filhos dos nobres herdavam, além do título nobiliárquico, uma vaguinha camarada no Parlamento.

Sempre que há campanha eleitoral na Inglaterra, aparecem políticos – principalmente trabalhistas – prometendo uma reforma do sistema. Em 1997, Tony Blair até que conseguiu fazer alguma coisa. Acabou-se a hereditariedade dos lordes e previu-se a possibilidade de que parte da Câmara dos Lordes fosse eleita pelo povo, e não que fosse constituída somente por pessoas indicadas pelo soberano. No entanto, até agora não se chegou a um consenso sobre qual a percentagem dos lordes passaria a ser eleita.

Além disso, uma reforma de 2005 previu a criação de uma Suprema Corte para a Inglaterra. Confesso que não sei se essa Corte já foi efetivamente implementada ou não. Entretanto, seria mais um duro golpe na nobiliarquia. Retiraria da Câmara dos Lordes uma de suas principais funções: funcionar como última instância judicial (como o nosso STF).

Não importa quanto tempo passe. O fato é que, mais hora, menos hora, a Câmara dos Lordes será extinta. Ou, se não extinta, será pelo menos transformada em uma assembléia inteiramente composta por cidadãos eleitos. Quando isso acontecer, um dos únicos poderes do monarca britânico será definitivamente extinto.

A Rainha da Inglaterra será, então, mais Rainha da Inglaterra do que nunca.

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