Há muito tempo o Moura Grande me cobrava esse post. O problema é que o tempo – sempre escasso – nunca me deixava sentar para escrevê-lo. Mas hoje, com um pouquinho de ajuda da sorte, ei-lo:
Todo mundo aprende da escola que a I Guerra Mundial começo quando um estudante sérvio assassinou em um atentado o herdeiro do trono Austro-Húngaro, o arquiduque Francisco Ferdinando. Depois do fim da guerra, foram entrevistar o sujeito que o assassinara. Perguntaram algo mais ou menos assim:
“Como você se sente sendo responsável direto pela morte de 50 milhões de pessoas?”
E ele:
“Eu nunca poderia imaginar que fosse terminar naquilo”.
Não podia mesmo.
Pra explicar como começou a I Guerra Mundial, é preciso voltar um pouco no tempo.
Quem leu o post sobre Bismark, sabe que a Alemanha deu uma sova nos franceses na guerra-franco prussiana (1970). Ao fim da guerra, a Alemanha colocou condições humilhantes para a rendição francesa. Entre elas, a que mais doía nos franceses era a perda da região da Alsácia-Lorena, ao leste francês, para os alemães. Desde sempre, os franceses queriam vingança.
Depois da unificação alemã, o país germânico começou sua escalada rumo ao desenvolvimento. Com uma população grande, bem educada, e com recursos naturais suficientes para a empreitada, os alemães começaram a ameaçar a hegemonia européia, sempre disputada entre França e Inglaterra.
Os ingleses, que eram uma ilha não só geograficamente mas politicamente, não queriam nada com a Europa. Por eles, o continente inteiro poderia se danar, desde que não surgisse uma potência que pudesse rivalizar consigo, especialmente nos mares, o grande filão da época. (Só para se ter uma idéia, em meado do séc XIX, a armada inglesa, sozinha, era maior do que todas as outras somadas).
O pano de fundo, como sempre, era a capacidade de possuir e explorar colônias no além-mar, principalmente na África. Quem detivesse o domínio da Europa, mandaria no mundo, eis o raciocínio que todos faziam à época.
Vendo a ascenção alemã, os ingleses começaram a coçar a cabeça. A corrida armamentista iniciada pela Alemanha tinha feito com que a supremacia britânica estivesse a perigo. Isso produziu um dos resultados mais inesperados de todos os tempos: pra fazer frente à Alemanha, a Inglaterra aliou-se à França, seu rival histórico, contra a qual travara uma centena de guerras desde sempre. Ambos, à época, eram os maiores colonizadores do mundo, isto é, eram os países que tinham mais colônias sob seu jugo.
Pra não deixar por menos, os alemães resolveram se aliar aos seus antigos rivais, os austríacos. Sabendo das lutas fatricidas que corroíam as entranhas do Império Austro-Hungáro, a Alemanha sabia que, numa união com a Áustria, continuaria exercendo o papel de protagonista.
Também insatisfeita com a “repartição” do mundo entre Inglaterra e França, a Itália resolveu se aliar aos alemães e aos austríacos, esperando que, de uma eventual guerra, pudesse tirar algum proveito (leia-se: obter colônias ultramarinas). Estava formada, pois, a Tríplica Aliança.
Pra equilibrar o jogo, ingleses e franceses foram atrás de um novo parceiro, pra intimidar os alemães. Escolheram um que supunham ser bastante intimidador: a Rússia. (Mal sabiam eles que a Rússia estava prestes a explodir na Revolução de Outubro). Formava-se, então, a Tríplice Entente.
E qual era a Rússia nessa história? O que é que ela tinha a ganhar com isso?
Seguinte: à Rússia não interessava uma Alemanha forte como vizinha. Os russos viam os alemães como concorrentes na disputa pela hegemonia no leste europeu. Além disso, os russos e seu pan-eslavismo queriam reunir sob uma só bandeira todos os povos eslavos, aí incluídos os que se encontravam nos balcãs. Para o infortúnio de todos, os balcãs se encontravam no meio do Império Austro-Húngaro, aliado dos alemães. Ou seja: uma aliança contra a Alemanha era duplamente justificável.
Já para os ingleses e franceses, aliar-se à Rússia tinha dois propósitos: primeiro, juntar o maior (e mais despreparado) exército em contigente humano do continente; segundo, intimidar os alemães com a ameaça de uma “guerra em duas frentes”: ao oeste, contra os franceses e ingleses, e ao leste, contra os russos.
Armada a barraca, daí para o estopim foi um pulo. Todo mundo queria a guerra. Era necessário só um pretexto. E foi isso que um estudante sérvio de 19 anos, Gavrilo Princip, deu a eles.
Os sérvios lutavam por independência e contra opressão do Império Austro-Húngaro. Sérvia e Bósnia haviam sido anexadas em 1908, e não estavam nem um pouco satisfeitas com isso. Gavrilo Princip achou uma boa idéia assassinar o herdeiro do trono austríaco como forma de, digamos, “mostrar descontentamento”. Sem querer, deu início àquele que seria o maior conflito da história.
A Áustria culpou a Sérvia pelo assassinato. Como “reparação”, exigiu uma série de coisas, incluindo autorização para que a polícia austríaca participasse das investigações e implementasse a punição aos culpados. A Sérvia concordou com todas, menos esta. Foi o bastante para a Áustria declarar-lhe a guerra.
Em socorro da Sérvia, a Rússia declarou guerra ao Império Austro-húngaro. Isso gerou um verdadeiro efeito dominó: em resposta à declaração de guerra, o Império Austro-Húngaro e seus aliados, Alemanha e Itália, declararam guerra à Rússia. Por força dos acordos que formaram a Tríplica Entente, Inglaterra e França declararam guerra aos países da Tríplice Aliança.
A Belle Époque chegava ao fim. O horror que se seguiria a ela não era imaginado por ninguém. Segundo os estatístivos, os mortos na I Guerra Mundial superaram todos aqueles que tinham morrido em todas as guerras anteriores da humanidade.
Olhando-se agora, a guerra era inevitável. Mas a sua inevitabilidade só foi descoberta depois.
Há apenas um lapso meu caro Senador: à época da eclosão de 1ª Grande Guerra, a Sérvia era independente. Somente a parte norte da atual Sérvia, onde os sérvios haviam criado, em 1848, a sua região autónoma conhecida como Voivodina Sérvia foi transformada ,em 1849, em novo território austríaco conhecido como Voivodato da Sérvia.
De fato, Comandante. Mas, salvo engano, ela estava ocupada pelo Império Austro-Húngaro. E o grande lance era que os austríacos ocuparam também a Bósnia, detonando os planos sérvios de fazer uma grande nação eslava, o que só veio a acontecer após a II Guerra Mundial, com Josef Broz Tito e sua Iugoslávia. Daí a razão do atentado ao arquiduque Francisco Ferdinando. Tudo poderia ter se passado se eles tivessem lembrado Bismark: “Os balcãs não valem os ossos de um granadeiro pomeraniano”. Abraços.
Só para instigar: e a Palestina vale tanto sangue?
Palestina é um capítulo à parte. Matéria para outro post. Mas não, não vale uma gota do sangue que já foi derramado por ela.
será a Palestina mais um caso de bullying??:O
Kkk. Pode ser, afinal…
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