Aproveitando o mote da votação do salário-mínimo, vou tentar explicar um pouco o processo de aprovação de leis no legislativo pra derrubar alguns mitos.
Como todo mundo sabe, no Brasil o legislativo é bicameral. Há uma casa em que estão os representantes do povo (Deputados), e outra, na qual estão os representantes dos Estados (Senadores).
Na Câmara dos Deputados, a número de representantes de um estado é diretamente proporcional à sua população. Quanto maior a população, maior a sua representação. No entanto, há algumas distorções. Isso porque, pela Constituição, nenhum estado pode ter menos de 8 e mais de 70 deputados. Mas isso é matéria pra outro post.
Já no Senado, é todo mundo igual: cada estado tem 3 representantes.
Pois bem. Há um mito de que o processo legislativo não anda, é empacado, justamente por causa desse sistema bicameral. Quem reproduz o mito gosta de sair por aí dizendo que uma lei aprovada na Câmara, ao ser modificada no Senado, retorna pra Câmara, que, se a modificar novamente, retorna pro Senado, num ping-pong sem fim.
Isso é uma meia-verdade.
Esse tipo de vai-e-vém só acontece com Emendas à Constituição. Nesse caso, a proposta tem que ser aprovada em cada casa do Parlamento, em dois turnos, pela maioria de 3/5 dos seus membros. Se houver alteração, a proposta de Emenda volta pra outra casa, que tem que aprová-la. Se houver nova modificação, volta-se tudo de novo.
Mas com as leis o negócio é diferente. Veja o caso do salário-mínimo:
A Câmara acabou de aprovar o salário de R$ 545,00. Se a proposta for ao Senado e for aprovada na base de R$ 545,00, tudo bem; vai-se direto pra sanção. Mas se o Senado aprovar uma emenda ao projeto subindo o valor pra R$ 560,00, p. ex.?
Aí, volta pra Câmara, que vai se limita a decidir se aceita ou não a emenda feita no Senado. Aprovando, fica o valor de R$ 560,00. Mas se a Câmara rejeitar a emenda, o projeto é remetido diretamente à sanção do Presidente. Ou seja: prevalece o valor de R$ 545,00.
Como assim? Quer dizer que o que o Senado decidiu não vale nada?
Mais ou menos. No Brasil, nesse sistema bicameral, há um princípio chamado de Prevalência da Casa Iniciadora. Assim, a Casa em que começou a tramitar o projeto tem, por assim dizer, a última palavra na matéria.
Isso só não vale se o projeto for rejeitado inteiramente. Nesse exemplo, se o Senado derrubasse totalmente o aumento do mínimo – ou seja, decidisse por aumento nenhum – aí o projeto iria pra gaveta. Mas, aprovando-o com modificações, a Casa na qual se iniciou a tramitação terá a última palavra sobre essas modificações, decidindo, ao final, o que vai prevalecer.
Como, pela Constituição, a imensa maioria dos projetos necessariamente deve começar sua tramitação pela Câmara, normalmente são os deputados quem têm a última palavra em matéria de aprovação de leis. Isso porque, por serem, efetivamente, representantes do povo (ao menos em tese), o Constituinte entendeu que eles têm maior legitimidade pra decidir os caminhos do país.
Por isso, fique esperto, e não se deixe enganar por manipulações da imprensa.