“No mercado, você pode fazer de tudo, só não pode panicar”.
Eis o lema de onze em cada dez traders que pagam de influencers nas redes anti-sociais. O mandamento nem chega a ser ruim. Afinal, decisões tomadas de cabeça quente dificilmente levam a coisa boa. E quanto tem dinheiro envolvido, então, é que a porca realmente entorta o rabo.
Otávio, contudo, sempre fez pouco caso do conselho. Seu negócio era operar alavancado. A alavancagem, para quem não sabe, permite que o sujeito opere um volume muito maior do que ele dispõe em carteira. Com um mini-contrato de dólar, por exemplo, você consegue montar uma posição equivalente a US$ 10 mil. Com o dólar a quase R$ 6, isso significa que o sujeito toma um risco equivalente a R$ 60 mil. Para negociar esse tipo de contrato em esquema de day trade – isto é, comprar e vender no mesmo dia – as corretoras costumam exigir garantias ridículas, algo como R$ 100 reais de patrimônio somente.
Por que alguém faz isso?
Bom, com os valores acima, se o sujeito compra um mini-contrato de dólar com a cotação a R$ 6 e ela vai a R$ 7, ele embolsa a bagatela de R$ 10 mil, Como variações desse nível são difíceis e demoradas, quem está em busca de dinheiro rápido e fácil multiplica a quantidade de contratos. Com 100 mini-contratos, por exemplo, o sujeito ganha os mesmos R$ 10 mil caso a cotação avance um mísero centavo. Nem é necessário dizer que, caso a operação vá na mão contrária, o sujeito perde o mesmo valor pra banca. Caveat emptor (o risco é de quem compra), diriam os romanos.
Ao contrário de Otávio, Luiz Fernando fazia o gênero mais comedido. Ressabiado e desconfiado dos lucros do papelório, rejeitava qualquer forma de alavancagem. Seu esquema era crescer um pouquinho por dia, mas sempre na mesma direção. Para isso, fazia o que a galera do mercado chama de “análise fundamentalista”. Lia balanços, estudava cenários, analisava o contexto macroeconômico, etc. Era do tipo que não abria nem a mão (por hábito), nem a guarda (por temperamento).
Amigos de faculdade, Otávio e Luiz Fernando de vez em quando costumavam trocar idéias sobre investimento. Com duas linhas de atuação tão diferentes, era difícil que houvesse concordância em alguma coisa. Mesmo assim, eles se falavam com frequência, com Otávio sempre tentando convencer Luiz Fernando a embarcar na aventura:
“Avalancar é como andar de skate em montanha-russa, Luiz Fernando. Se você não cair, é lindo!”, costumava brincar um sempre bem-humorado Otávio.
Numa determinada manhã, porém, Otávio estava especialmente eufórico. Descobrira um novo tipo de derivativo: contrato futuro de café. O sujeito nem sequer tomava café, mas estava certo de que o gráfico estava dando sinal de que ia subir que nem foguete. Luiz Fernando ainda tentou argumentar contra, lembrando de quando Otávio confundira o ticker de Cosan (CSAN3) com o de CSN (CSNA3) e quase teve que vender um rim para cobrir a margem na operadora. O apelo, contudo, foi em vão.
“Coloca pelo menos um stop na operação, Otávio…”, disse um preocupado Luiz Fernando.
“Stop é para os fracos!”, rejeitou Otávio de plano a sugestão.
Por óbvio, aconteceu o esperado. Aliás, aconteceu o inesperado. Não só o café não subiu, como havia previsto Otávio, mas despencou 5% em apenas uma hora. Com um lote gigantesco de contratos na mão, os R$ 20 mil que a figura tinha na corretora foram reduzidos a ridículos R$ 2,75. Ironicamente, o saldo na conta não era o suficiente nem para comprar um cafezinho na bodega da esquina.
“E agora?!?”, perguntou um desesperado Otávio ao amigo Luiz Fernando.
Luiz Fernando foi breve, porém certeiro:
“Agora é hora de panicar, Otávio. Você fez por merecer”.
E foi assim que Otávio descobriu que existe merecimento mesmo nos momentos de pânico…