Os anos 80 representeram uma revolução na música brasileira. Nunca antes – e nunca depois – surgiria uma geração tão talentosa em tanta profusão. Kid Abelha, Blitz, Metrô, Leo Jaime, enfim, foram muitos os grupos e cantores que explodiram nessa década supostamente “perdida”.
Eu sei, muitos deles acabaram despontando para o anonimato (e hoje fazem a festa de uma das seções deste blog). Mas a grande maioria ficou. Se não fazem mais música como antigamente, é algo que se deve creditar mais ao avanço da idade daquela geração do que a uma inexistente falta de talento de quem compunha música naquele tempo.
Durante muitos anos, boa parte da crítica era reticente a figuras como Lulu Santos, Lobão, Paralamas, Engenheiros. Pros críticos da hora, a música feita por esses caras era “menor”; não era digna de entrar no grande panteão da MPB. É verdade, a músicaem nada lembrava os áureos tempos da bossa nova, nem continham a elegância e o toque musicais de um Chico Buarque ou de um Gilberto Gil.
O que eles não entendiam era a música que eles faziam não era “menor”; era só diferente. E música diferente não é necessariamente música pior. Pelo contrário. Era uma música de grande qualidade.
Com a agenda política relativamente bem encaminhada (apesar do fracasso das diretas, o país terminaria a década elegendo seu primeiro presidente em 24 anos), os artistas dessa geração puderam se dedicar a expressar coisas do cotidiano. Algo bem próximo às pessoas mesmo. Amor, encontros, desencontros, desilusões, adolescência…coisas que acontecem com qualquer pessoa, e que tornam possível desenvolver uma empatia quase que imediata com a música.
Mas nem por isso essa geração abandonou a crítica social. Um dos maiores exemplos disso foi o poeta da ironia.
Quem é? Agenor de Miranda Araújo Neto.
“Nunca ouvi falar”.
Tá bom, vai. Cazuza.
Cazuza era um gênio. Um dos maiores que apareceu na grande geração do pop-rock brasileiro dos anos 80. Infelizmente, só depois que assumiu publicamente sua luta contra a AIDS a crítica musical rendeu-se a suas composições.
No começo da carreira, Cazuza era membro da Barão Vermelho, junto com Frejat e alguns outros coadjuvantes. Mas era Cazuza a alma da Banda.
Chamada a compor a trilha sonora do filme Bete Balanço, o Barão Vermelho e Cazuza escreveram clássicos como Bete Balanço e Maior abandonado (vídeo abaixo):
A participação no primeiro Rock in Rio significou a consagração definitiva da banda. Mas Cazuza queria mais. Largou o grupo e deu início a uma curta, meteórica e profundamente controvertida carreira solo.
Cazuza chegou logo arrebentando. Botou a boca no trombone. Cantava versos tão bonitos quanto cínicos. O melhor exemplo disso é Ideologia:
Meu partido é um coração partido
E as ilusões estão todas perdidas
Os meus sonhos foram todos vendidos
Tão barato que eu nem acredito…Ah, eu nem acredito
Pouco a pouco, Cazuza transitou do pop-rock para a MPB. As músicas foram ficando menos batidas, isto é, com menos guitarra e menos bateria, e mais vocal e violão.
Mesmo escrevendo músicas românticas, Cazuza representa a glorificação da ironia. Quem pode se esquecer dos versos de Codinome Beija Flor?
Pra que usar de tanta educação
Pra destilar terceiras intenções
Mas, na minha opinião, a obra prima de Cazuza é Brasil. A ironia não é fina, nem mesmo sutil. Mesmo assim, de tão inteligente, o seu destinatário (Rede Globo) não entendeu a mensagem:
Não me sortearam a garota do Fantástico
Não me subornaram; será que é meu fim?
Tem TV a cores na tava de um índio
Programada pra só dizer: “Sim, sim”.
Não só Brasil foi a música-tema da abertura de uma das novelas de maior sucesso da história da Globo – Vale-tudo – como no aniversário dos seus 50 anos chamaram a Ana Carolina pra cantá-la no show.
Há 20 e poucos anos, o Brasil perdia Cazuza pra AIDS. Mas a música que ele escreveu permanece aí, viva, servindo de inspiração pra muita gente.
Salve galera!!! Assistam meu clipe e digam o que acharam 🙂