Certas coisas são tão recorrentes que por vezes é difícil acreditar que tanta gente caia nelas. Tal é a impressão de quem assiste ao noticiário econômico do dia-a-dia.
Recapitulando: o país foi paralisado há um mês com a greve dos caminhoneiros; encontra-se virtualmente em processo de anomia há pelo menos um ano; enfrenta a maior onda de desemprego do século; vê a relação dívida/PIB subir a cada manhã; e não enxerga em ninguém no rol de candidatos a presidente a capacidade de tirar o país do buraco. Tudo isso e mais alta dos juros americanos, queda do crescimento europeu e uma potencial guerra comercial entre Estados Unidos, China, Europa e quem mais vier pela frente. Não precisa ser nenhum vidente pra enxergar uma crise de proporções apocalípticas logo ali, dobrando a esquina.
E o mercado financeiro no meio disso tudo?
Bem, no mundo encantado do tal de “Mercado”, parece que tudo vai às mil maravilhas. O dólar subiu, é verdade, mas está bem longe de uma explosão semelhante a 2002, véspera de Lula 1. A Bolsa deu uma corrigida, mas ainda está acima da máxima histórica de 2008. Os juros futuros andam razoavelmente comportados e ninguém parece acreditar numa hecatombe até o final do ano. Quem olha para os números, fica com a impressão de que o desemprego no Brasil é igual ao norte-americano, o IDH está igual ao da Suíça e Henrique Meirelles é favorito a ser o presidente na virada do ano, com direito a ampla maioria no Congresso.
Infelizmente, o buraco é mais embaixo.
Na verdade, tudo no mercado financeiro gira ao redor de ilusões. Ou, como gostam de repetir os “çábios”, tudo se resume às “expectativas”. Se a maioria dos analistas acha que as coisas vão melhorar, melhor elas irão. Se, ao contrário, a crença maior é numa derrocada, começam a soar as trombetas do Juízo Final. A ninguém ocorre parar pra pensar se as “análises” dessa gente encontram algum fundamento na realidade. Pode parecer um exercício de frivolidade, mas isso está longe de ser um exercício de retórica para iniciados.
No maravilhoso mundo do mercado, acredita-se – sabe-se lá Deus por quê – que o teto de gastos seguirá firme e forte, as urnas de 2018 nos brindarão com alguém comprometido com as “reformas” e que, cedo ou tarde, os republicanos colocarão um freio nos arroubos de Donald Trump. Daí os números exuberantes da ciranda financeira, que rodam alegremente a cada dia enquanto boa parte da população cai no conto do vigário.
No mundo real, o que se tem é um país acéfalo, com uma regra constitucional que se tornará impraticável em menos de ano e meio, e meia dúzia de candidatos que não falam mais do que parolagem, vendendo um populismo safado que não resiste a mais de 3 segundos de entrevista séria. Como desgraça pouca é bobagem, Trump se sente cada vez mais à vontade com suas peraltices e já se discute a sério como será o seu segundo mandato, cortesia de uma oposição democrata autocondenada à inanição.
Pode parecer um tanto dramático, mas, cedo ou tarde, as ilusões se desfazem e o cidadão comum vai descobrir que se encontra em um país sem governo, uma dívida crescendo como bola de neve e sem nenhuma perspectiva de solução a partir de 2019. Nesse momento, o pobre incauto cairá na real e tomará noção do tamanho do engodo que foi obrigado a engolir.
É esperar para ver.