Em um mundo em que a Espanha tem um em cada quatro trabalhadores desempregado e no qual a direita xenófoba européia pretende responsabilizar os imigrantes por todos os males do mundo, a notícia da reforma imigratória dos Estados Unidos não deixa de ser um bálsamo de esperança por dias melhores.
Em primeiro lugar, pela questão política. O acordo para levar adiante a reforma partiu de um grupo de senadores dos partidos Republicano e Democrata. Tudo bem que Obama deu uma forcinha ao estabelecer a mudanças nas condições de vida dos imigrantes como uma das prioridades de seu segundo mandato. Mas só isso seria pouco. A plataforma fora lançada no início do primeiro, e nada havia sido feito desde então. A que levou Republicanos e Democratas a deporem temporariamente as armas foi uma conclusão tão óbvia quanto difícil de aceitar: ao invés de problema, os imigrantes podem ser a solução para a crise.
No livro A consciência de um liberal, Paul Krugman faz um apanhado histórico de como o sectarismo partidário conduziu à paralisia política, que teve seu auge na crise de 2008, depois da quebra do Lehman Brothers. Durante as décadas de 40 e 50, eram comum haver “intersecções” entre os integrantes de um e outro partido. Tipo: uma proposta do presidente democrata Franklyn Roosevelt era aprovada com os votos de seus companheiros de partido e com pelo menos metade dos votos republicanos. À medida que o século XX foi chegando ao seu final, a proporção de representantes que votavam a favor de uma proposição de um presidente adversário caiu a menos de 10%.
O ponto máximo da divergência sectarista foi a rejeição ao primeiro plano de resgate proposto pela administração Bush. Tido como “salvacionista” e até mesmo “socialista”, o plano foi rejeitado pelos próprios partidários de Bush, simplesmente por ser associado a idéias “dos democratas”. E isso aconteceu em um período no qual a economia americana, bêbada, dançava à beira do abismo.
Em segundo lugar, a reforma imigratória, além de resgatar uma agenda histórica de segregação ainda presente na sociedade americana, reordena o eixo da discussão para o que de fato interessa. As crises – todas elas – não têm nos imigrantes as suas causas, apesar de a maioria deles sofrem efeitos bem pesados de suas conseqüências.
A regularização da condição cidadã dos imigrantes americanos permitirá, de início, o aumento na arrecadação de impostos. Depois, incrementará os negócios, pois imigrantes ilegais, com dinheiro no bolso, temem “crescer” muito e chamar a atenção dos fiscais da imigração. Tudo isso ajuda a incrementar a economia. Mais do que um estorvo, os imigrantes podem ser o dínamo necessário a dar um impulso para a saída da crise.
Os mais céticos podem argumentar que nada disso teria lugar se os republicanos não tivessem se dado conta de que o eleitorado latino (e imigrante) tem um peso cada vez maior nas eleições. Pode ser. Mas antes uma mudança de paradigma baseada na realpolitik, do que a manutenção de um status quo perverso com base em fundamentalismos ideológicos de cunho preconceituoso.